Juiz de Fora-MG  -  quinta, 21 de novembro de 2024  

História do Caminho Novo




A iniciativa partiu de Artur de Sá e Menezes, governador da capitania do Rio de Janeiro, preocupado em reduzir o tempo de viagem entre o litoral e as minas. Com efeito, uma consulta ao mapa mostra o longo desvio que eram obrigadas a fazer as pessoas que rumavam para as minas a partir do Rio de Janeiro: do porto fluminense seguiam para Parati por via marítima e, daí, por terra até os entroncamentos paulistas do Caminho Velho (Taubaté e Guaratinguetá). Essa viagem podia levar, segundo fontes primárias, três meses.

Para a abertura de um caminho que abreviasse substancialmente o percurso entre o litoral e as minas, foi contratado o sertanista Garcia Rodrigues, filho do grande Fernão Dias e um dos participantes da bandeira de 1674-81. Quando de sua contratação, em 1698, Garcia Rodrigues já se estabelecera como sesmeiro, proprietário de duas roças, uma às margens do rio Paraibuna e outra na Borda do Campo (hoje município de Antônio Carlos).

Em 1700, após muitas dificuldades, o sertanista conseguiu concluir a picada para pedestres, passando então a aprimorá-la para que desse trânsito também para animais de carga, com o objetivo de explorar o promissor privilégio do uso exclusivo da via. Alguns anos mais tarde, entre 1722 e 1725, foi aberta uma variante do trecho fluminense do caminho de Garcia Rodrigues, encurtando ainda mais a nova via. Essa variante passava pela serra da Estrela e pelo Córrego Seco, ou Itamarati (Petrópolis), indo encontrar o caminho original na região onde hoje está o município fluminense de Paraíba do Sul.

Em algumas décadas o Caminho Novo se tornaria a principal via de acesso do litoral sul do território colonial à região mineradora da capitania das Minas Gerais. Há registros históricos de que o tempo de viagem entre o Rio de Janeiro e Vila Rica se reduzira a dez dias, evitando-se ainda, pela nova via, os lamaçais da serra do Mar e a travessia marítima até Parati.

Já nas primeiras décadas do século XVIII o Caminho Novo estará totalmente pontuado por roças, pousos, ranchos e povoados, todos eles formados e desenvolvidos como bases de apoio para os viajantes da via. O relato de viagem do ouvidor-geral Caetano da Costa Matoso, incluído no Códice Costa Matoso, aponta diversos núcleos urbanos, que mais tarde se tornarão cidades importantes, como Petrópolis, Paraíba do Sul, Juiz de Fora, Barbacena e Santos Dumont.

Mapa Caminho  NovoMapa Caminho Novo

A consolidação do Caminho Novo provocou poderosa transformação no contexto econômico e político colonial. A cidade do Rio de Janeiro passou a centralizar a rota de povoamento, abastecimento e circulação mercantil da região aurífera e diamantífera, suplantando as vilas paulistas e a Bahia como centro distribuidor de pessoas e mercadorias para a capitania das Minas Gerais e como porto de escoamento do ouro. Desse modo, o Rio de Janeiro passou a enviar aos povoados e vilas mineradoras escravos negros, açúcar, cachaça, gado, feijão, arroz, farinha e os produtos importados da Europa, que, com o refinamento social da capitania das Minas Gerais, passaram a ser crescentemente demandados pela população local.

Do ponto de vista político, o Caminho Novo significou que a supremacia paulista na região das minas estava definitivamente vencida. Os imigrantes emboabas, em especial os portugueses, passaram a ter um caminho direto para as minas, completamente independente dos entroncamentos paulistas do Caminho Velho. Reinóis passaram a afluir com muito maior intensidade para o interior mineiro, via a larga porta de entrada que se lhes abrira no Rio de Janeiro. E mais, ricos e importantes moradores da cidade passaram a ser aquinhoados com concessões de sesmarias ao longo da nova via, o que, aos olhos de gente como Garcia Rodrigues e os primeiros colonos paulistas, configurava abuso injustificável.

Nas últimas décadas do século XVIII, quando se preparava a tentativa libertária da Inconfidência Mineira, o Caminho Novo se tornou via privilegiada de propagação de idéias. O líder revolucionário, que conhecia bem a estrada, por nela ter servido como Comandante do Destacamento do Caminho Novo e como Comandante da Patrulha do Mato, tendo sido responsável inclusive pela abertura de um de seus ramais, por ela colocou em circulação os ideais republicanos e liberais do movimento. E, depois de debelada a tentativa revolucionária, teve o alferes Joaquim José da Silva Xavier expostas as partes do seu corpo esquartejado ao longo do mesmo Caminho Novo - no sítio da Cebola (hoje Inconfidência, município de Paraíba do Sul), no arraial da Igreja Nova (Barbacena), na estalagem da Varginha (Conselheiro Lafaiete) e no sítio das Bandeiras (Ouro Preto).

Texto de Márcio Santos - Pesquisador de rotas antigas, autor de Estradas Reais - Introdução ao estudo dos caminhos do ouro e do diamnte no Brasil, licenciado em Filosofia, especializado em Formação Política e Econômica da Sociedade Brasileira, consultor em Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais.

 


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